CAMPEÃ VENCEU O MEDO - Maya Gabeira: 'Não estava pronta para desistir. Por isso voltei a surfar as ondas que quase me mataram'
Há sete anos, a surfista brasileira quase se afogou em uma famosa praia de Portugal onde podem ser encontradas algumas das maiores ondas do planeta. Apesar do trauma, ela voltou a enfrentar seus medos e já bateu o recorde mundial por duas vezes lá. Ela conta à BBC por que 'não estava pronta para desistir'
Mesmo antes de entrar na água, Maya Gabeira sabia que teria sérios problemas se as coisas dessem errado na famosa Praia do Norte, em Portugal.
Localizada na vila de Nazaré, a 100 km ao norte de Lisboa, ali onde podem ser encontradas algumas das maiores ondas do mundo.
Então, quando a surfista ouviu o rugido do monstro de 20 metros de altura desabando cada vez mais perto dela, a brasileira praticamente aceitou seu provável destino. "Eu só pensei: 'É isso, vou morrer'", diz Maya à BBC.
Um vídeo do YouTube com mais de 500 mil visualizações mostra o que aconteceu na sequência: um volume de água com peso estimado em 144 toneladas caiu sobre a brasileira.
É mais ou menos o mesmo peso de uma baleia azul, caso você esteja se perguntando. Das grandes, inclusive.
O impacto arrancou o colete salva-vidas de Maya, a empurrou para baixo da água e quebrou imediatamente uma de suas pernas. Ela ficou inconsciente.
A Praia do Norte em Nazaré é famosa por registrar algumas das maiores — e mais perigosas — ondas do mundo
Renascimento
A brasileira foi resgatada pelo também surfista Carlos Burle, que a acompanhava — Burle foi o responsável por dirigir o jet-ski que levou Maya além da arrebentação para pegar a onda.
Uma sequência de ondas tornou o resgate ainda mais difícil, apesar de Maya ter recuperado brevemente a consciência. Demorou quase dez minutos para Burle levar a brasileira à costa, onde ela teve que ser ressuscitada.
Que Maya Gabeira tenha pensado em voltar a qualquer lugar próximo de uma grande onda depois do episódio de 2013 já é notável.
Mas ela foi além de simplesmente enfrentar seus medos: sete anos depois de quase se afogar, Maya já bateu duas vezes o recorde mundial da maior onda já surfada por uma mulher. Ambas na Praia do Norte.
Sua última marca foi confirmada pelo Guinness Book of Records no dia 10 de setembro: uma onda de 22,4 metros de altura surfada no dia 11 de fevereiro.
É também a maior onda surfada por alguém em 2020 (até agora). A brasileira, de 33 anos, explica como construiu essa reviravolta.
"Fiquei muito atordoada e ferida. Tive de decidir se tentaria continuar surfando ou se era melhor me aposentar. Mas não estava pronta para desistir."
Maya tomou essa decisão ainda deitada no leito da unidade de tratamento intensivo de um hospital português.
Pouco depois de acordar, ela pediu para ver o vídeo do acidente. "Eu queria ver o que tinha acontecido porque minha memória do acidente parava em quando desmaiei."
"Era importante saber o que eu tinha feito de errado."
Cicatrizes físicas e mentais
O acidente custaria à surfista quatro anos de sua carreira. Ela teve lesões nas costas e passou por três cirurgias para resolver o problema.
Maya superou traumas físicos e mentais para voltar a surfar
"Cada operação me mantinha longe da água por meses. Eu simplesmente não conseguia atingir minha melhor forma."
Mas Maya também se preocupou com o que a onda tinha feito na mente dela. "Meu corpo estava doendo, mas eu tinha um medo enorme de sofrer outro acidente", explica ela.
"Estava com uma falta de confiança de me colocar naquela situação novamente."
Criando monstros
As barreiras psicológicas de Maya foram muito problemáticas para a carreira dela.
A brasileira é uma surfista especializada em ondas gigantes. Isso é bem diferente do que fazem a maioria dos surfistas profissionais, que costumam pegar ondas bem menores.
Os mais famosos não costumam chegar nem perto das ondas gigantes da brasileira e de outros big riders, como são chamados esses surfistas.
'Big riders' são surfistas especializados em ondas gigantes
A principal razão para essa distinção é que as ondas gigantes exigem um conjunto de habilidades diferente das de um surfista comum.
As ondas de Nazaré, por exemplo, são muito grandes e rápidas para os surfistas remarem até o ponto onde elas são surfadas. Atletas como Maya precisam ser rebocados até elas por jet-skis.
Os surfistas atingem velocidades de até 80km/h em ondas como as da Praia do Norte — muito mais rápidas do que as velocidades alcançadas nas ondas convencionais.
Nos últimos anos, a notoriedade da Praia do Norte cresceu mesmo fora do mundo do surf. Maya sabia que Nazaré continuaria sendo o principal palco dos big riders.
Se ela quisesse permanecer no esporte, teria que domar a onda que quase a matou.
Conheça seu inimigo
Então, em 2015, a brasileira fez as malas e mudou-se para a vila de pescadores portuguesa, que tem uma população de pouco mais de 15 mil pessoas.
A pequena vila de pescadores da Nazaré é visitada por pessoas de todo o mundo que vêm ver as ondas monstruosas formadas pelas tempestades do Atlântico
Maya morava no Havaí desde os 17 anos, poucos anos depois de trocar as sapatilhas de balé por uma prancha de surfe no Rio de Janeiro, sua cidade natal.
Foi lá onde ela se apaixonou pelo surfe de ondas grandes, ao mesmo tempo em que percebeu que era um clube de meninos. "Quase não havia mulheres big riders quando comecei e achei que precisava mudar aquilo", lembra ela.
Em Nazaré, Maya escolheu um local com vista para o Oceano Atlântico, seu novo vizinho.
"Para mim fazia todo o sentido vir para Portugal. Se eu vivesse em Nazaré, me familiarizaria com essa onda e compreenderia muito melhor como ela é", afirma.
"Em tempos de competição, ao invés de viajar, eu já estaria no local. Dormindo na minha própria cama, tendo uma rotina."
A surfista brasileira mudou-se para a Nazaré na tentativa de saber mais sobre a onda que quase a matou
Maya aponta o dia 9 de novembro de 2017 como a data em que ela finalmente se sentiu pronta de corpo e mente para enfrentar as ondas gigantes.
Feliz e aliviada
Foi outro encontro contundente com uma onda feroz. Mas desta vez as coisas foram diferentes. "Saí da água feliz e aliviada, apesar de não ter conseguido terminar a onda", conta.
"Fiquei numa situação difícil, mas não morri. Virei uma página para mim porque me obriguei a dizer a mim mesmo: 'Você não vai morrer toda vez que enfrentar essa onda.'"
Em janeiro de 2018, ela pegou uma onda na Praia do Norte que um especialista independente aferiu ter 20,7 metros de altura.
Foi a maior onda já surfada por uma mulher. Maya sonhava em entrar para o Guinness, o Livro dos Recordes, mas na época havia apenas uma categoria agrupando surfistas de ambos os sexos.
Maya afirma que recebeu o apoio inicial da Liga Mundial de Surfe (WSL, na sigla em inglês), o órgão regulador do esporte que poderia oficialmente reconhecer o feito. Mas que depois a WSL ficou em silêncio.
Em uma declaração em agosto daquele ano, o órgão disse que estava "discutindo o processo" de certificação da onda.
Maya reuniu suas tropas: uma petição assinada por mais de 20 mil pessoas pressionou publicamente as autoridades do surfe.
Em outubro, duas semanas antes do quinto aniversário de sua experiência de quase morte, o Guinness finalmente reconheceu o recorde.
"Foi uma situação horrível", lembra Maya. "Fiquei tão estressada que meu desempenho competitivo caiu muito. Mas eu fiz o que precisava ser feito."
Maya pediu apoio público para que sua onda de 2018 fosse reconhecida como um recorde mundial
A polêmica expôs questões de desigualdade de gênero no surfe, que surpreendem em um esporte historicamente associado a uma atitude antiestablishment.
Foi apenas em 2019 que competidores masculinos e femininos começaram a ganhar prêmios em dinheiro iguais. Mas ainda há mais torneios masculinos do que femininos.
"A situação está mudando, e precisamos de tempo para que as coisas se encaixem", acredita Maya.
"Há vários sinais de que as autoridades do esporte estão tratando com seriedade a desigualdade de gênero no surfe".
Ela dá um exemplo atrevido — sua segunda onda de quebra de recorde. "Desta vez, nem precisei de petição para que meu recorde fosse reconhecido", ri a brasileira.
Pais com unhas roidas
Poucas pessoas no Brasil ficaram surpresas ao ver Maya se posicionando.
O pai dela é Fernando Gabeira, um renomado político e jornalista brasileiro que se tornou um famoso crítico da ditadura militar (1964-1985). Ele participou inclusive do MR8, um grupo de guerrilha urbana, antes de ser exilado.
"Ela está lutando por mais reconhecimento das mulheres surfistas, e isso é tão importante quanto competir", disse Gabeira à BBC.
"Quanto ao medo, ela já quebrou o nariz diversas vezes, então, você meio que se acostuma", acrescenta o pai.
Nem ele nem a mãe de Maya, a estilista Yame Reis, tentaram impedir a surfista de voltar para o esporte depois do acidente em Portugal — apesar de ambos os pais admitirem que ainda roem as unhas na temporada de ondas grandes.
'O melhor que podemos fazer é apoiá-la', diz a mãe de Maya, Yame Reis
rfar em Mavericks, um temível ponto de surfe de ondas grandes no norte da Califórnia, nos Estados Unidos.
Yame frequentemente visita a filha em Nazaré e faz questão de sempre fazer uma oração enquanto observa o oceano.
"Todo cuidado é pouco, né?" diz a mãe de Maya, meio brincando e meio falando sério.
Fonte: R7
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