Ao Euro, ao mestre, com carinho



Há pessoas que, como (falsas) músicas apresentadas como “sucessos” e que não resistem a alguns dias em cena. Há outras que acabam se transformando em autênticas lendas. Ontem, 25 de novembro, foi a vez de um desses muito raros personagens sair da vida para entrar (pela porta da frente) na História. Uma História da qual muitas vezes ele próprio foi personagem.

O jornalista e mestre de várias gerações de jornalistas, o decano Euro Tourinho pegou “o expresso da meia-noite” seguindo para o “andar de cima”. A menos de dois meses de completar 98 anos o matogrossense mais rondoniense que pode existir mudou-se para outra dimensão.

Do Euro há muito do que escrever e do que contar. Há coisa de um mês e pouco, com os jornalistas Osmar Silva e Crio Pinheiro, fui visita-lo, num encontro onde não se falou de doença, remédios e médicos, essa xaropada que parece ser uma norma padrão quando se vai conversar com alguém que esteja doente. Euro falou um bocado, riu muito e fez uma declaração que ficou gravada na minha mente “Eu não tenho raiva de ninguém. Tinha um aí que falava mal, mas eu já perdoei”.

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O Euro era uma espécie de celebridade, lenda e unanimidade entre nós aqui. Excelente contador de histórias, de causos e de fatos nessa vivência que durou mais de 80 anos trabalhando em e por Rondônia. Como diretor de redação ele era, mais, um outro colega do que, realmente, diretor.

Trabalhei com ele mais de 20 anos e sempre ele vinha com um jeito tranquilo, até para chamar a atenção. E quando algum “democrata” o procurava para demitir um de nós – eu sei de vários casos comigo mesmo – ele dizia que quem mandava no jornal era ele, e ponto final. Apesar de exercer o comando do jornal, a redação ficava à vontade até porque o respeito que todos tínhamos para com ele não permitia que se fizesse aventuras. Nunca o vi impondo qualquer matéria de seu interesse, e quando havia divergência ele aparecia como apaziguador.

Respeitado, mesmo quando o AM já se encontrava em fase de decadência, e até mesmo após deixar de circular, o Euro era visto com deferência por todos. Um viciado em trabalho: Em 2017, quando circulou a última edição do Alto Madeira, o Euro, apesar dos já 95 anos completados, dava expediente manhã e tarde, até à noite, diariamente. Ficar em casa era motivo para cair doente.

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Um diretor que agia muitas vezes como repórter, de até pouco tempo sempre andava com sua máquina, se não me engano uma velha trip-35, e que ao elaborar os textos, nada de computador, preferia sua velha máquina portátil. E quando o texto ficava pronto vi, muitas vezes, ele chegar e pedir para colocar sua matéria, nunca mandava.

Um fato que sempre chamou minha atenção em relação ao euro é o respeito que profissionais, muitos deles já experimentados em outros Estados e jornais de maior peso no país, tinham, e têm por aquela figura pequena, boêmia, carnavalesca, que a partir deste dia 25 passou a ocupar o justo lugar no Whalala, onde ficam os melhores guerreiros, conforme a lenda dos wikings.

O Euro fez História, ele era a própria dita cuja. Tenho a certeza de que sua chegada ao Whalala foi muito concorrida. A coletiva logo após passar pelo controle de acesso deve ter tido de tudo, ao reencontrar seus muitos colegas que com ele trabalharam, ou não, e que a todos ele atendeu depois, claro, de abraçar a companheira de mais de 70 anos de vida comum, a “tia” Maria, e já deve, a essa altura, estar retomando seu famoso “caderninho azul”.

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Aos filhos, aos familiares, àqueles que mais de perto estiveram com o Euro, nossos sentimentos.



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