ALEXANDRE GARCIA NA REVISTA OESTE - Bruxas rondando
Parece um plano para enfraquecer o Brasil, enfraquecendo a estrutura da nação
Mesmo com toda a segurança para o G20, assaltantes de moto, armados, levaram o carro do ministro secretário-geral da Presidência da República, Márcio Macedo, na madrugada de quinta-feira, na Lapa, centro do Rio de Janeiro, não muito longe do local que vai receber as mais altas autoridades de 20 países. O carro foi levado para o Complexo da Maré, um dos santuários do crime da ex-capital do Brasil. Na capital, na Praça dos Três Poderes, um chaveiro de 59 anos lançava bombas barulhentas, mas não destruidoras, contra o prédio do Supremo, para depois explodir a própria cabeça.
Uma semana antes, quem chegasse ao Brasil pelo Aeroporto de Guarulhos descobriria que havia desembarcado num país que não soube lidar com o crime. Entre nós, brasileiros, no entanto, para saber disso não foi preciso o assassinato a tiros de fuzil na saída do maior aeroporto do Brasil. Está na cara de todos nós, há décadas, mas não reagimos. Nossos representantes políticos não agem diferente de nós. Para fingir que fazem alguma coisa, anunciam medidas ilusórias, de propaganda. Vão anunciando programas, intervenções superficiais e transitórias, mas tudo fica só na demagogia. As leis lenientes continuam as mesmas, a mídia continua induzindo o povo a ficar contra a polícia, e os assaltantes, traficantes e contrabandistas continuam sendo muito bem tratados pelas audiências de custódia e voltam às ruas para assaltar e matar. A impunidade infla a cultura da transgressão da lei, e a corrupção é premiada com ausência de castigo. Figurões da Lava Jato, ativos e passivos, vão sendo anistiados de fato por um tribunal cujo presidente já antecipou que é contra a anistia para manifestantes do 8 de janeiro.
O crime já tem há décadas áreas fora da soberania do Estado nacional no Rio de Janeiro e agora se expande na Amazônia e nas grandes cidades. Na Amazônia, a repressão federal mira brasileiros pobres e trabalhadores, que plantam e criam gado, enquanto o tráfico vai cominando. Não é de hoje, vem de muitas décadas, desde a existência de autoridade sob mesada do jogo do bicho. E todos fomos induzidos, pela mídia e intelectuais, a pensar que isso é natural. Juntam-se a fraqueza e ineficácia das leis à fraqueza e ineficácia dos que representam o Estado, em seus três níveis e seus três Poderes. E a sabedoria popular, que tudo observa, pelos capilares do Estado, sabe quem vende sentença, quem recebe propina do crime, quem facilita, quem está infiltrado. Muita gente se sente tentada a demonstrar poder, revelando as coisas erradas que o chefe faz.
Parece um plano para enfraquecer o Brasil, enfraquecendo a estrutura da nação. Por isso ficamos subindo um degrau e descendo dois, subindo três e caindo quatro, numa ciclotimia doentia. Vejo, por exemplo, que desde 2010 estamos quase parados em produtividade e PIB, mesmo com os grandes avanços do agro. Com o nosso potencial, a vocação é de potência, mas, embora não acredite em conspirações, sinto que se enfraquece a célula-básica da nação, a família; restringe-se a religião, que dá valores e temores; o ensino vira catequese ideológica e esquece as ciências e artes; divide-se o brasileiro em sulistas e nordestinos, em homens e mulheres, em brancos e negros, em pobres e ricos; separam até por preferências sexuais, embora isso seja uma questão privada. Liberam-se drogas para fragilizar o amor-próprio.
Até as forças armadas são alvo dos que querem dividir. Enfraquecidas já estão, por falta de recursos. “Divide et impera”, usavam os romanos para dominar. Fazem tudo para fragilizar a polícia. A política externa fica sem rumos, a censura ilegal cala a manifestação do pensamento, o pagador de impostos é onerado até esmagarem a livre-iniciativa; o Estado precisa de mais impostos para custear seus privilégios; tira-se a autonomia financeira dos municípios e Estados; de indivíduos e das pessoas jurídicas públicas e privadas para que dependam apenas de um poder central, porque assim fica mais fácil dominar — e não notamos tudo isso, como não notamos, por décadas, o crescimento do crime. Assim cresce a dominação, não sei se planejada e concertada ou se improvisada e espontânea. Como disse Cervantes, pela boca de Dom Quixote, em tradução livre: “Não acredito em bruxas, mas elas andam por aí”. Que las hay, las hay.
(revistaoeste)
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