OPINIÃO DE SÍLVIO NAVARRO - O Brasil no fundo do poço
Perseguições e censura aplicadas pelo STF e falas de Lula em defesa de ditaduras e terroristas preocupam o mundo — sobretudo os Estados Unidos, onde a liberdade é um direito inalienável
Nos últimos meses, o mundo começou a entender, da forma mais clara possível, o que está acontecendo no Brasil: a sociedade se tornou refém de um consórcio de poder que persegue, censura e, em alguns casos, prende quem não for submisso ao novo regime. Essa junta autoritária é formada pelo presidente Lula da Silva e pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Somam-se a essa ditadura disfarçada atos diplomáticos de um governo que perdeu a vergonha de se alinhar a países como Venezuela, China, Rússia e Irã, e de dar guarida ao terrorismo que assola Israel no Oriente Médio. Tudo isso ficou ainda mais explícito nesta semana.
No momento em que os principais jornais e o Congresso americano mostravam preocupação com o cerceamento de liberdades constitucionais e com a agenda ideológica do PT, Lula viajava a Nova York para a Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU). Levou uma caravana com mais de cem pessoas, a um custo milionário e ainda sigiloso, para vê-lo discursar.
Foi justamente em solo americano que o Brasil voltou a passar vergonha. Primeiro, Lula teve o microfone cortado porque estourou o tempo na abertura da “Cúpula do Futuro”, como se ali pudesse falar por horas a fio como fazia nos palanques do passado. Em seguida, na terça-feira, 24, usou seu pronunciamento na tribuna para defender Cuba, tratou a China como parceira preferencial — e não os Estados Unidos ou outras democracias de verdade —, atacou Israel e prometeu punir “plataformas digitais que se julgam acima da lei”, num recado endereçado ao dono do X/Twitter, Elon Musk.
Os presentes, contudo, queriam ouvir o que Lula tinha a dizer sobre outros dois temas centrais relacionados ao Brasil, mas ele se esquivou. Não explicou por que o país está em chamas, com recorde histórico de queimadas depois que retornou à Presidência da República. E ficou em silêncio sobre a Venezuela. No caso do país vizinho, o petista nem sequer fez menção sobre a fraude de Nicolás Maduro que o Itamaraty não quer condenar.
Lula enfrentou um inesperado constrangimento ao ser confrontado por outro presidente de esquerda sul-americano, o chileno Gabriel Boric, que, ao contrário dele, tem posições firmes sobre ditaduras e violações de direitos humanos. “As forças progressistas se veem debilitadas quando, diante de determinados conflitos, adquirem posturas titubeantes, em função de interesses e defesa de amizades mal-entendidas, ou de ideologias políticas, em vez de princípios”, disse Boric.
Segundo relatos de jornalistas presentes em Nova York, publicados nesta semana pela imprensa e nas redes sociais, o discurso de Lula na ONU causou desconforto tanto à delegação de Israel, que não aplaudiu a fala, quanto ao presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky. São duas guerras em curso no planeta, em que o petista se meteu sem ser chamado e ainda colocou o Brasil no lado errado da História.
Zelensky respondeu ao brasileiro no dia seguinte, quando chegou a sua vez de discursar na tribuna. Disse que o Brasil “tenta aumentar sua influência global às custas da Ucrânia” — ou seja, apoiando a Rússia de Vladimir Putin. “Talvez alguém queira incluir um Nobel em sua biografia por um acordo de cessar-fogo em vez de uma paz efetiva”, afirmou.
No caso da crise no Oriente Médio, o problema é mais agudo. Lula usa o debate sobre a criação de um Estado da Palestina para minimizar o terror provocado pelo Hamas — e agora encampado pelo grupo libanês Hezbollah, financiado pelo Irã. Ele parabenizou a delegação da Palestina no seu pronunciamento e falou em 40 mil mulheres e crianças mortas por ataques “motivados por vingança” de Israel. Não se sabe a fonte desse novo número citado, mas é bem menor do que as 12 milhões de crianças mortas que ele inventou num discurso feito em abril deste ano. Além disso, a primeira-dama, Janja da Silva, compareceu ao evento vestida a caráter — com um casaco presenteado pela Embaixada Palestina — e causou frisson porque quis fazer fotos no auditório, o que foi interpretado como uma provocação por boa parte da plateia.
Não foi só. Na véspera, o chanceler informal, Celso Amorim, assessor especial para assuntos internacionais, voltou a criticar a resposta israelense aos foguetes lançados contra civis pelo Hezbollah, a exemplo do tratamento que dá ao Hamas. Muita gente estranhou: por que o homem forte do Itamaraty faria uma declaração nesse tom, além do traje escolhido por Janja da Silva, horas antes de estarem diante da delegação israelense na conferência mundial?
“O presidente mostra simpatia com as vítimas do conflito em Gaza e no Líbano, mas ignora as vítimas de Israel, que está se defendendo”, disse em nota a Confederação Israelita do Brasil. “O governo Lula adaptou a tradição de equilíbrio da política externa a essa sua guinada radical de aproximação com o Irã. O país todo paga pelo crescente desprestígio e descrédito na arena internacional.”
Lula ainda fez um terceiro discurso, no encontro do G20, que reúne as maiores economias do planeta. Apresentou uma proposta para liderar uma espécie de Constituinte para reformar a ONU, abrindo mais espaço para países da América Latina e da África em áreas delicadas, como o Conselho de Segurança. Na prática, o que ele pedia era a revisão da Carta das Nações Unidas, até prevista no artigo 109, mas jamais reivindicada desde 1945. A proposta do petista, contudo, não foi incluída no documento final da reunião, principalmente porque muitos países não gostaram da ideia de “taxar super-ricos” nem da ladainha do “Sul Global”.
“Se os países ricos querem o apoio do mundo em desenvolvimento para o enfrentamento das múltiplas crises do nosso tempo, o Sul Global precisa estar plenamente representado”, disse Lula, à espera do endosso dos presentes, que não veio.
No Brasil, com exceção dos apoiadores de carteirinha bem conhecidos na mídia, o fato é que a fala de Lula na ONU não foi festejada como outrora. Um ano e nove meses depois da posse, as críticas na mídia brasileira começaram a aparecer em editoriais por causa das bravatas sobre meio ambiente, a conivência com a ditadura sanguinária na Venezuela e os ataques pesados contra os judeus — principalmente depois de comparar a guerra contra terroristas ao Holocausto.
O jornal O Estado de S. Paulo publicou editorial intitulado “Um santo do pau oco na ONU” e afirmou que o Itamaraty está “sob o comando espúrio de Celso Amorim”. Ainda citou no texto o francês Libération, que se refere a Lula como um “falso amigo”. A Folha de S.Paulo disse que “quem tem um desempenho sofrível em linhas fronteiriças não deveria se atrever a resolver conflitos no Oriente Médio e no leste da Europa. Melhor cuidar da casa, que não vai bem”.
Nos Estados Unidos, sede da assembleia mundial, as publicações ignoraram o discurso de abertura do evento feito pelo brasileiro — não há menções no Wall Street Journal, Financial Times, The Economist nem no New York Times. A exceção foi o Washington Post, que dedicou algumas linhas críticas sobre as contradições de Lula na área ambiental: o que ele diz não bate com a realidade de um país em chamas, da Amazônia ao cerrado. Tampouco foi citado na Europa pelo El País ou The Gardian, por exemplo.
Quem estampou as publicações americanas e o britânico Financial Times foi o argentino Javier Milei, tratado pela diplomacia brasileira como arquirrival. “Nessa mesma casa, que pretende defender os direitos humanos, também incluímos ditaduras sangrentas no Conselho de Direitos Humanos, incluindo Cuba e Venezuela, sem reprovação”, disse Milei. “Nessa mesma casa, que pretende defender os direitos das mulheres, permitimos países que punem suas mulheres apenas por mostrarem a pele.”
(revistaoeste)
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