ENTREVISTA COM CONFÚCIO: "Não me meto em nada do que ele está fazendo" - Vídeo
O ex-governador Confúcio Moura (MDB) confirmou esta semana sua candidatura ao Senado Federal. “Eu já fui deputado federal e não tenho interesse nessa disputa. Já conheço a Câmara, hoje se me derem o cargo sem concorrer, eu não quero nem de graça, e não é por menosprezo", disse.
Confúcio elegeu-se deputado federal três vezes consecutivas, em 1994, 1998 e 2002.
"Cada momento no seu tempo. Aos 44 anos eu me dediquei à reforma agrária, Rondônia ainda não tinha nada, nem eletrificação rural, nem estradas, e isso a gente fez com Fernando Henrique Cardoso. Agora, com meus 70 anos, posso contribuir para o Brasil com a minha experiência de prefeito, secretário de saúde, de deputado federal, de governador".
Se eleito, prometeu estimular a reforma política e outros projetos bons para o Brasil". "Não adianta essa reforma do Judiciário que nunca deu resultados, porque deve ser associada às reformas política e constitucional; fazendo as duas coisas, o Brasil toma rumo", garantiu.
Confúcio rejeita ser conhecido como "governador das greves”. Enfrentou 19 em dois mandatos.
Uma semana depois deixar o Palácio Rio Madeira, ele concedeu entrevista ao Notícias Tudo Aqui. Ela sai publicada em três partes, nas quais o ex-governador analisa rumos do partido no qual milita há quatro décadas, desde o Território Federal.
Como se sente fora do poder? A carga é leve?
Confúcio Moura – É uma fase de adaptação, porque o ritmo de governo é muito forte, de agendas alucinantes, e o mais difícil é que a gente tem que ter capacidade para decidir. Governo que não decide, não é governo. E governar é decidir conflitos. Certo ou errado tem que decidir.
Já estou num período de transição mental, fazendo a virada da página, o esquecimento, não abrindo a boca para as críticas, não me referindo ao atual governador, não me metendo em nada do que ele está fazendo, e assim resguardando a posição de ex.
Setores do MDB insistem em que o senhor saísse para a Câmara e não para o Senado...
Eu já fui deputado federal e não tenho interesse nessa disputa. Já conheço a Câmara, hoje se me derem o cargo sem concorrer, eu não quero nem de graça, e não é por menosprezo. Hoje eu me sinto um elemento moderador" para a República Brasileira. Já dá para moderar o ímpeto da Câmara dos Deputados, fazendo parte de uma Câmara Revisora.
“SEMPRE ADMINISTREI INTERESSES E CONFLITOS”
Missão fácil ou difícil? O desapego se dá assim num estalo?
O governo é tenso. Sempre administrei interesses e conflitos, e só com um tempinho fiz alguma coisa boa. Foram sete anos e três meses de muita dedicação. O desapego não é num estalo, não. Eu fico assim pensando: o que eu tenho pra fazer? Lá em casa, em Ariquemes, vou à cozinha, vejo lá o cachorro, vou ao computador, o dia é longo, e procuro algo que não sei o que é. Um vazio, por assim dizer.Mas essa é uma fase de desintoxicação, igual a uma síndrome de abstinência. De dependência química, mental, corporal e espiritual. Eu paro e noto que o corpo precisa de um ajuste. Eu espero virar a situação trabalhando agora, visitando os municípios, me ocupando.
“A FOLHA E AS DESPESAS VÊM SUBINDO”
Em seu discurso na transmissão de posse o senhor mencionou o Conselho Superior de Governo. Como ele funciona?
Hoje ele é Lei. Governador não governa sozinho. Os membros do Conselho se reuniram a cada quatro meses. Procuradoria do Estado, Assembleia Legislativa, Tribunal de Justiça, Ministério Público, Defensoria, cada um expôs seus problemas e dificuldades e todos analisaram os dados econômicos do estado.
Na mais recente reunião nós constatamos que a folha e as despesas vêm subindo e comendo a capacidade de investimentos. Como é que o governo vai fazer hospital, presídio, ponte, tapar buracos de estrada?
O Dr. Walter Waltenberg [presidente do TJ] nos sugeriu a parar os concursos para atividades meio e investir em tecnologia, assim obtendo redução de pessoal e recuperando a capacidade de investimento. A ideia foi abraçada por todos, foi lavrada uma ata, e assim veio sendo feito. Agora, eu não tenho mais poder de voz, nem voto, mas haverá cobrança nesse sentido aos que vierem.
"BATEDOR DE CARIMBO NÃO EXISTE MAIS"
O Programa Governo sem papel é parte dessa tecnologia?
Taí funcionando. É difícil substituir o papel do pessoal que bate carimbo, né? Tem gente que bate carimbos há 30, 40 anos. Como é que ele fica? Esvaziam-se as funções deles, muitos ficam até no corredor. Há um ou outro local teimoso, onde ainda não funciona o programa, mas a burocracia trivial que amarra os processos tende a desaparecer, não pela pessoa, mas porque o sistema eletrônico a substitui.
“PRECISAMOS REVER E AJUSTAR O MODELO DE ESCOLA NO BRASIL”
O senhor lançou projetos educacionais e um deles, Asas do Saber, busca diminuir a evasão escolar. Como analisa a educação na Amazônia e no País?
Exatamente. O Ensino Médio no Brasil é um grande gargalo, vive uma situação dramática devido à evasão. É assustadora a quantidade de meninos de 15 a 18 anos fora da sala de aula, porque ela é chata e desinteressante. A rua é mais gostosa, a diversão é com as redes sociais, então, porque ficar numa sala de aula tradicional? Como diz um educador de Portugal, nossa escola é do século XIX, nosso professor, do século XX, e nosso aluno do século XXI, usuário do Facebook, do Instagram.
Nossa escola é do estilo de padre e freira do século XIX, isso não funciona mais. Nosso aluno está na quarta revolução industrial, procura tudo e encontra no Google, vê shows, ouve e posta músicas no Youtube. Ele não combina, não encaixa, porque a escola é velha, o estilão é velho, e o professor é do século XX.
O que fazer?
Precisamos rever o modelo escolar no Brasil, ajustá-lo, porque, fundamentalmente, o professor tem que ensinar.
O senhor distribuiu tablets para professores? Deu certo?
Isso ainda está em avaliação. O Instituto Positivo é quem nos forneceu esse material. Ele força muito o professor a aprender, postar hoje a aula de amanhã. Postar também questionários e fazer um banco de provas, de perguntas, tirar dúvidas e filmar aulas resumidas de dez minutos. Não precisa mais que isso. Dez minutos basta!
Se o professor fizer um bom resumo da aula de matemática ou de química, terá enorme proveito e interage com o aluno. A aula em que o professor vai pra frente do quadro negro (lousa), vira as costas para o aluno, fica escrevendo e ele copiando, já não era bom desde o tempo antigo. Não se tem mais paciência.E a salvação do Brasil passa pelo Ensino Médio. Se não alfabetizarmos desde os seis, sete anos, ele vai crescer analfabeto até a Faculdade.
[N.R: Segundo o Banco Mundial, no Brasil 16% dos alunos não completam o Ensino Médio e 52% não completam o Ensino Fundamental; 1,7 milhão de jovens de 15 a 17 anos estão fora da escola; 17% dos jovens de 25 a 34 anos se formam; 55% dos estudantes são reprovados em leitura e matemática.]
“NÃO QUERO SER CONHECIDO COMO GOVERNADOR DAS GREVES”
Em 2001, quando o senhor assumiu, o maior desafio era a educação. Acumulavam-se demandas de outros governos. Ao sair, o senhor enfrentou mais uma greve.
Eu administrei quatro greves na educação. Eu não quero ser conhecido como governador das greves, infelizmente foram 19. Isso é pesado no currículo de um governador, mas eu fui negociando caso a caso, segurando o ímpeto dos sindicatos, trazendo eles para uma discussão técnica das leis e dos recursos, fomos conformando a todos e oferecendo aquilo que o estado podia ofertar. Fechamos as contas pagando fornecedores. Não existia, Osmar, até o dia em que eu saí, um só cobrador à porta da Secretaria de Finanças.
Situação diferente aconteceu anteriormente...
Sim, teve governo em que eles iam armados, ficavam olhando o que caía no caixa do ICMS do dia, para pressionar o secretário a fazer os seus pagamentos. Somos contadores de moedas, porque qualquer despesa interessava e poderíamos reduzi-las. Eu aprendi com Cláudia Costim e Bresser Pereira [ministros de administração federal e reforma de Estado no governo Fernando Henrique Cardoso].
O desperdício naquela época era de 40%. Lâmpadas acesas, ventilador e ar condicionado ligados, peças de carro mais caras, carro parado, carro cedido, gente que bate o ponto e vai embora, falta de produtividade. Bresser, um grande economista e administrador, concluiu que o desperdício no Brasil era uma riqueza extraordinária jogada na lata do lixo.
“FUI CORTANDO PASSAGEM AÉREA DENTRO DO POSSÍVEL”
Eram 1.200 veículos com pessoas carregando papéis em Porto Velho, hoje são 120. Houve mais ajustes, foram eles que contribuíram para o senhor entregar o governo no azul?
Exatamente. O bom administrador não é o que gerencia receitas, mas o que controla despesas, sabendo administrar de tudo com parcimônia. Havia uma mania de se pegar passagem aérea para atender a um convite para seminário, fórum ou congresso. Isso, o servidor deve bancar do bolso, porque é investimento nele próprio, e não no governo. Um congresso em Belém, ou na praia bem longe, em Natal, na fronteira em Foz do Iguaçu, tudo isso saia muito caro.
No começo o senhor tentou estimular a multiplicação de conhecimento quando a pessoa voltava...
E não houve não. Faziam turismo. Ele (o servidor) ia a Foz, ficava na dele, atravessava para Ciudad del Este (Alto Paraná, Paraguai) e quando voltava não transmitia conhecimento de seu simpósio para ninguém.
Eu creio que qualquer preparação de pessoal deva ser feita no chão da fábrica, do ambiente de trabalho. Uma sumidade internacional trazida para fazer um palestrão a mil, dois mil professores, não dá resultado nenhum.Alguns saem pra fora, conversam, não há proveito. Essa preparação dá certo lá no Centrer, depois de Ouro Preto do Oeste, internando todos eles (professores) durante sete dias para comer, descansar. Participando em regime de retiro espiritual. Uma fala, outra fala, todos se perguntam e se entendem. Não adianta fosforizar ideias malucas de mandar a pessoa a congressos por aí, isso só resulta em diplominha que ela leva pra casa, sem proveito.
2ª Parte - CONFÚCIO: “JOÃO PAULO II TEM O MELHOR PLANTÃO DA MADRUGADA” - VÍDEO
3ª Parte - CONFÚCIO: ”EM TEMPO DE INDIGNAÇÃO, NÃO CORREREI RISCO, NÃO QUERO PROCESSO” – VÍDEO
MONTEZUMA CRUZ e OSMAR SILVA
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