Rondônia recebe e redireciona os “rios voadores”, que abastecem chuvas no centro-sul do continente. Posição geográfica do estado faz dele uma espécie de “esteira rolante de umidade”.
A expressão popular “onde o vento faz a curva” geralmente é usada para se referir a lugares distantes. Porém, em Rondônia essa frase ganha um significado literal: o estado está localizado exatamente no ponto onde os ventos que cruzam a América do Sul mudam de direção.
O Grupo Rede Amazônica conversou com o professor João Gobo, especialista em climatologia da Universidade Federal de Rondônia (UFRO), que explica como a posição do estado está diretamente relacionada aos ventos e às chuvas de todo o país e até ao futuro da floresta amazônica.
Ele explica que esse papel estratégico de Rondônia no clima sul-americano está diretamente ligado aos Jatos de Baixos Níveis (JBN), que são correntes de vento carregadas de umidade que se deslocam próximo à superfície, partindo da Amazônia.
Esses jatos também são conhecidos como “rios voadores” porque levam água na forma de vapor e alimentam chuvas em outras regiões do Brasil. Rondônia está justamente no ponto onde esses ventos mudam de direção, o chamado “ponto de inflexão”.

Mas por que os ventos não conseguem passar pelas Cordilheiras?
Os Andes formam a cadeia de montanhas mais extensa do mundo, com relevo elevado e pressão atmosférica reduzida. Essas características criam uma barreira natural que impede o avanço dos ventos vindos da Amazônia. É como se os Andes fossem uma parede, e Rondônia, a esquina onde esses ventos dobram o caminho.
Rondônia como epicentro da umidade continental
De acordo com Gobo, a posição geográfica do estado faz dele uma espécie de “esteira rolante de umidade”. O vapor d’água que evapora da floresta e do oceano é empurrado pelos ventos entre os Andes e o Planalto Brasileiro, ganhando velocidade e seguindo em direção ao centro-sul do continente.
Esse movimento é essencial para formar a Zona de Convergência do Atlântico Sul (ZCAS), que leva chuvas para regiões como o Sudeste e o Centro-Oeste do Brasil.
A posição geográfica de Rondônia é estratégica:
- Está a leste dos Andes, o que a coloca diretamente na rota dos JBN.
- Fica abaixo da faixa equatorial, onde há forte influência da Monção Sul-Americana, que regula os ciclos de chuva e seca.
- Está entre biomas como a Amazônia e o Cerrado, o que contribui para uma rica interação entre umidade, temperatura e relevo.
Essa combinação faz com que o estado receba grandes volumes de umidade e registre chuvas intensas, especialmente no verão, quando a monção está ativa.
A monção sul-americana é um sistema de ventos que muda com as estações, trazendo chuvas intensas no verão. Ela ocorre pela diferença de temperatura entre o continente e o oceano, que atrai ar úmido para o interior do Brasil.
Um inimigo: o desmatamento

A floresta amazônica funciona como uma gigantesca fábrica de vapor d’água. As árvores liberam umidade para a atmosfera por meio da evapotranspiração: um processo natural que mantém o ar úmido e alimenta os ventos que transportam essa umidade pelo continente.
Quando há desmatamento, essa produção de vapor diminui. Isso afeta diretamente os Jatos de Baixos Níveis (JBN), que dependem dessa umidade para levar chuva para outras regiões. Com menos vapor disponível, os ventos perdem força e a Zona de Convergência do Atlântico Sul (ZCAS) também enfraquece.
Rondônia não é apenas “onde o vento faz a curva”, é onde o clima da América do Sul se desenha. A ciência confirma o que a sabedoria popular já manifestava. Entender essa dinâmica é essencial para proteger a floresta, o clima e o futuro da região.
(portalamazonia)