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DIA DOS PAIS - No Dia dos Pais, filhos eternizam na lembrança os que partiram durante a pandemia

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Em frente à locomotiva 18, a máquina que mais pilotou na vida de ferroviário

 

Os filhos não mais irão cumprimentá-lo ou abraçá-lo, mas se lembrarão no próximo domingo da saga do ex-ferroviário Manoel Soares da Silva, antigo morador do bairro Triângulo, que a Covid-19 levou aos 84 anos.

Em Porto Velho e Brasília, os filhos sentirão a falta dele nesta data especial criada nos Estados Unidos em 1909.

Depois de quatro dias de internação hospitalar e mais um de UTI, Manelão, como era conhecido, não resistiu, morreu em 15 de julho passado.

Estava entubado* e sofreu o que milhões de pessoas no mundo sentem, quando necessitam dessa intervenção: um grande incômodo.

Núbia Lopes, sua nona filha, tradutora de Libras (Língua Brasileira de Sinais) no Governo de Rondônia desabafa: “É claro que o nosso coração fica apertado, será o nosso primeiro Dia dos Pais sem a presença dele”.

Como é possível isso? Ela explica: “Estou agarrada aos bons momentos que tivemos, aos ensinamentos que ele nos legou, à fortaleza que ele era”. Núbia perdeu também a filha Nicole Lorrana Sussuarana Silva, 19 anos, em 31 de maio, acometida pela mesma doença.

“Com fé, perseverança, amor, lembrando seus feitos com velhos amigos dele, cuidei de meu pai até o último minuto de vida”, ela conta.

“Na sacada do hospital ele me mostrava a direção da casa do encanador, a casa do eletricista, e em seus minutos finais eu disse que o abraçava e dele também ouvi o mesmo; a felicidade de tê-lo tido é maior do que a dor de tê-lo perdido”.

 

O 1º à esquerda, com capatazes e maquinistas durante reparos na máquina 15 em 1981

O TREM SOCIAL

Paraense nascido em Nova Timboteua, Manelão veio para o velho Território Federal do Guaporé ainda criança, aos nove anos, trazido pelo irmão mais velho José Marques da Silva, que era conhecido por Gato em Guajará-Mirim.

O saudoso ex-ferroviário sonhava com a reativação do trem até Santo Antônio do Rio Madeira, hoje bairro da Capital.

“Ele transportou sonhos e conduziu vidas amazônicas; nesses confins, as pessoas carregavam mais sonhos do que bagagens, o sonho do Eldorado”, observa Núbia resgatando um pouco do século passado na região.

O trem saía da estação de Porto Velho e não tinha o objetivo de correr, mas de atender a todos da beira da linha, passava pelo Abunã, e por isso não podia chegar a Guajará-Mirim no mesmo dia.

“Imagine, o trem parar em cada acampamento para embarque e desembarque de pessoas, carregamento da produção agrícola, mudanças e até animais domésticos”, diz Núbia.

Era assim mesmo. Ao sinal da bandeirada, o trem diminuía a marcha para recolher sacos de castanha embarcados por seus passageiros da zona rural e da floresta, na época, mais floresta que rural. E assim sucedia também com sacos de arroz, milho e feijão.

A parada era autorizada pela chefia do tráfego na estação de Porto Velho. Além de escoar a produção agrícola, a Madeira-Mamoré também transportava pessoas doentes em busca de tratamento.

MENSAGEM DE AMOR AOS PAIS

 

“Meu pai foi um homem que sempre trabalhou por ofício e por amor, chorou no último apito do trem (10 de julho de 1972) e até depois de sua aposentadoria e da desativação da Estrada de Ferro Madeira-Mamoré  guardava detalhes de cada trecho percorrido pela locomotiva maria-fumaça”, conta Núbia.

 

“A máquina 18 era a paixão dele, porque foi a que ele mais conduziu”, ela diz.

 

“Sabia de cor os nomes de companheiros, o que cada um fazia no pátio das estações, no leito ferroviário, no trem, e honrou todas as atribuições que lhe deram em longos anos de trabalho”.

Núbia gravou um vídeo com Manelão, no qual ele explica a razão de tantas fotos dessa locomotiva espalhadas dentro da casa dele: “Teve um tempo em que eu morava dentro dela”, contava à filha.

Quando as locomotivas precisavam de peças, a direção da estrada de ferro o designava para viajar a Tubarão (SC) para buscá-las. Era habilidoso e tinha conhecimento. “Ser ferroviário foi mais que uma profissão, foi escola e porta que se abriu para um menino órfão”, diz Núbia.

A SAGA DO ÚLTIMO MAQUINISTA

Manelão conheceu a esposa Maria Lopes Sussuarana e com ela se casou em Guajará-Mirim, a 362 quilômetros de Porto Velho, na fronteira Brasil-Bolívia. Ali nasceram cinco dos dez filhos, outros cinco nasceram em Porto Velho. Maria faleceu quatro anos atrás, aos 78.

Em tempos do Território Federal do Guaporé, tradicionalmente, o Hino Nacional Brasileiro no Dia da Pátria, 7 de Setembro, era tocado por uma banda boliviana, e no dia 6 de Agosto, data da independência do país vizinho, uma banda brasileira tocava em Guayaramerín (Beni) o Hino da Bolívia.

Manelão viveu o período do governo Araújo Lima (1948-1951). Por trabalhar com o irmão mais velho dava conta dos serviços até às 19h, quando o ensaio da banca começava, porém, chegava atrasado.

O irmão dele consertava e fabricava sapatos. O tempo passou e, aos 18 anos, serviu o Exército Brasileiro. Já tinha noções musicais desde os 16, quando frequentava a Escola do Professor Melo e Silva,que também era juiz de direito.

Por causa do atraso aos ensaios, Melo e Silva conseguiu empregos na Madeira-Mamoré, para Manelão e outro amigo que se encontrava na mesma situação. Fez exame médico e assumiu o emprego no quadro extra de “trabalhadores tarefeiros”, em 1º de junho de 1953, ao inteirar 17 anos. De ajudante de foguista passou a auxiliar de maquinista, e no auge da carreira, a maquinista de trens de carga e de passageiros.

A destreza musical nata de Manelão levou-o a participar das bandas do 5º Batalhão de Engenharia de Construção (BEC), da PM, e do coral da Igreja Assembleia de Deus. “Nos momentos difíceis ele se refugiava na música e se guiava pelo Evangelho que aplicava à sua vida com entusiasmo”, conta Núbia.

Foi então que o ex-ferroviário abraçou o novo serviço, tocou trombone em diversas solenidades e permaneceu na ferrovia até o melancólico fim do trem. E seguiu trabalhando para o batalhão, porque lhe faltava o tempo necessário para aposentadoria pela extinta ferrovia.

O ÚLTIMO APITO

Um dos três ferroviários antigos que viviam em Porto Velho, Manelão participou da reconstrução do trecho de sete quilômetros da ferrovia pelo ex-governador Jorge Teixeira de Oliveira. Restaram seu bispo e seu Belém, que um dia foram homenageados pela Assembleia Legislativa, junto com Manelão.

Quando Manelão faleceu, Núbia escreveu um texto, atribuindo a continuidade da missão dele, agora, “no céu”.

Para ela, o pai foi um dos maiores guardiões da história local. Do trem, tudo conhecia: aprendeu soldagem, manutenção, reposição de peças, e transporte de cargas. “Ele pilotou a Mad Maria em momentos de declínio e glória, conduzindo pessoas de todas as classes; também transportou grandes personalidades, entre as quais, o ex-governador Jorge Teixeira”, disse.

“Homem que amou os filhos, netos e bisnetos, escolheu uma vida honrosa e de fé em Cristo. Isto ele ensinou com palavras e com sua própria vida. Combateu o bom combate, concluiu a carreira e guardou a fé. Desde agora a Coroa da Justiça lhe espera ao qual o Justo lhe premiará”, ela acrescenta.

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* Qualquer tubo translaríngeo causa algum grau de lesão às pregas vocais; às vezes, ocorrem ulceração, isquemia e paralisia prolongada das pregas vocais. A estenose subglótica (ESG) adquirida estreita a endolaringe é uma das causas mais comuns de estridor e desconforto respiratório em crianças. Podem ser congênitas ou adquiridas (90%), sendo estas, em geral, secundárias à entubação traqueal prolongada.

Fonte: Secom 


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