“Não se sabe se quem manda neste País é um juiz ou o presidente”
“Às vezes eu fico com a impressão de que essas corporações querem substituir os deuses antigos", critica Aldo Rebelo, referindo-se ao Ministério Público Federal e ao Tribunal de Contas da União.
Ex-presidente da Câmara e ex-ministro multitarefa, Aldo Rebelo deixou uma militância de 40 anos no PCdoB no ano passado e migrou para o PSB. Sete meses depois, em outro movimento tão surpreendente quanto, trocou o partido socialista pelo Solidariedade e apresentou uma pré-candidatura à presidência da República. Deixou de ser comunista?
"Eu me considero portador dos mesmos valores, das mesmas ideias, dos mesmos objetivos. Sou socialista desde menino", responde ao El País, sentado numa cadeira de balanço em seu apartamento, em São Paulo.
O que mudou, para Aldo, foi a esquerda. “Mudei de partidos para não mudar de convicções. Para não mudar de ideia, de rumo. A agenda da esquerda foi mudando, foi abraçando esses temas do identitarismo, do multiculturalismo, que são temas importantes, mas que eu não julgo que sejam os temas essenciais e decisivos para o país retomar o desenvolvimento, o crescimento, a luta contra as desigualdades".
MILITARES
E os militares, com quem Aldo conviveu entre 2015 e 2016, enquanto ministro da Defesa, que papel têm em sua planejada retomada do país? "Não vejo nenhuma razão para receio em relação ao papel dos militares. Eles querem, como a maioria dos brasileiros, um país melhor, mais justo, mais honesto, mais desenvolvido. Eles dão opinião como mais um brasileiro de classe média, e não como candidato a tutor, como muita gente interpreta". Segundo ele, a preocupação do militares é com o país, não com a política. "Eles não querem tomar conta dessa agenda difícil da crise fiscal, da Previdência, de segurança pública", comenta, lembrando que, quando ministro, mobilizou "200.000 homens para combater o mosquito da zika" e que sargentos, tenentes e comandantes das Forças Armadas se reuniram para salvar quatro milhões de sertanejos da seca em outra operação à época.
"Essas instituições têm essa dupla missão: defender e ajudar a construir o país", resume. O que ele condena é a tentativa de se apropriar do prestígio dos militares, que poderia esta acontecendo na intervenção federal no Rio de Janeiro. "O risco é transferir o desgaste do Governo para as Forças Armadas", alerta. "As Forças Armadas podem ajudar a reconstruir o aparelho de segurança publica do Rio de Janeiro. A presença ostensiva pode inibir o crime, mas há uma coisa que dará errado: tentar usá-las na repressão ao crime comum. Elas não dispõem dos meios, inclusive de inteligência. Isso é com Policia Civil e Militar".
ALIANÇAS
O pré-candidato à Presidência diz que ainda é cedo para discutir acordos partidários, apesar de seu nome ser especulado para chapa com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ). Enquanto não fecha parcerias, ele viaja pelos quatro cantos do país para promover sua agenda de retomada do crescimento, de aldeias indígenas ao Agrishow de Ribeirão Preto (SP).
Com seu eclético histórico de alianças, que vão do PT ao DEM, há algum concorrente ao Palácio do Planalto com que Aldo Rebelo não aceite conversar? “Não tenho lista de vetos”, responde. Nem o deputado Jair Bolsonaro (PSL-RJ), que tem sido alvo de tantas críticas? "Eu passei a vida inteira na Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional [da Câmara] conversando com Bolsonaro. Com as nossas diferenças, mas com respeito. Sempre respeitei e fui tratado com muito respeito. Dei projetos para ele relatar quando presidi a comissão. Era um deputado como qualquer outro. É candidato à presidência pelas regras do jogo. É preciso respeitá-lo e as pessoas que votam nele", diz.
LULA
Crítico da prisão do ex-presidente Lula, o ex-ministro faz um chamado ao diálogo a partir do incidente com tiros na passagem da caravana do petista pelo Paraná. "Imagine quem está seguro no país se uma caravana com dois ex-presidentes da República é vítima de um atentado a bala.
No Rio de Janeiro, recentemente, um general da reserva ia participar de um debate e foi agredido por um militante de esquerda. É inconcebível. A política faliu como alternativa de solução dos problemas se você não permite que seu adversário circule, faça campanha. Amanhã alguém pode dizer que você também não pode. Como resolver divergências sem conversar? Pode continuar discordando, mas não pode obstruir os meios de debate.”
RODOLFO BORGES
El País
Foto Newton Menezes (Estadão)
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