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O Secretário do nada

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O MDB (Movimento Democrático Brasileiro) de Ariquemes tinha uma turma fiel. A gente vinha atravessando o período de ferro da vida brasileira. A ditadura militar queria esganar o MDB. Qual seria a importância do partido em Ariquemes naquele tempo? Um milímetro acima de zero. Mas, assim mesmo, a gente gostava de fazer oposição. Achava gostoso fazer oposição. Nem sabia o motivo, mas, era bom fazer oposição. Pôr defeito em tudo. Dizer aquelas palavras de ordem de sempre: – democracia já! Fora os ianques! Uma nova constituinte!

Eu mesmo nem sabia o que era constituinte. O Marcos Freire dizia e eu repetia. Jerônimo Santana era o único deputado federal do Território Federal de Rondônia. O homem tinha uma língua de cascavel. Não tinha medo de nada. Até hoje eu não sei porque o Jerônimo não foi parar na cadeia. Era desaforado. A gente gostava dele. Ouvia todo dia a Voz do Brasil só pra ouvi-lo esgoelando na Tribuna da Câmara dos Deputados. Era uma euforia. Ele metia o pau nos governadores do Território, em geral, coronéis do Exército.

Pois bem, Jerônimo ganhou as eleições para governador do Estado em 1987. Ele sempre foi um “duro” de dinheiro. Andava mal arrumado. Paletó grande demais para o seu corpanzil. Guloso como ele só. Bolsos cheios de castanhas. Até mesmo pedaços de pé-de-moleque. Comia e esfregava as mãos gordurosas na calça. Vivia assim, do seu jeito e nós atrás, os seguidores, no Território inteiro ele tinha gente disposta a ir pra briga por ele.

Nossa turminha de Ariquemes tinha o diabo no couro. Ficava nos pontos de encontro de gente, pedindo voto para o Bengala (como era conhecido). Ele inventou este amuleto de “bengala” que pegou e ele andava na rua cutucando as pessoas com a  bengala. Bengala nele, Jerônimo!

Não sei por quais cargas d’água ele me convidou para ser o seu secretário de Saúde. Eu fiquei abismado. Nunca tinha ido à Secretaria de Saúde, não conhecia o Hospital de Base, nem sabia o que era uma licitação, nunca tinha ouvido esta palavra. Mesmo assim, caiu em cima, queria que eu fosse seu secretário. Pela providência divina fiquei adiando a resposta, adiando por mais de 30 dias, até que ele resolveu  usar a força do meu concunhado, então senador Iran Saraiva para me convencer a aceitar. Alice caiu no choro. Não queria, não queria que eu me metesse em política.Terminei aceitando.

Tomei posse. Fiz juramento. Nem sabia o motivo do juramento, mas jurei. Do mesmo jeito que se diz SIM na hora de casar. O “sim” vem por dever de casa. Sentei à mesa do secretário, não sabia nada do que fazer, fiquei ali lendo um livro que minha comadre Shirlei me deu de presente – a Lei 4.220 comentada. Coisa difícil de entender. Lia, lia, não compreendia nada.

Apareceu a turma da Maçonaria e me trouxe o Gedeão, como expert em gestão pública, até que era gente boa, de uma lábia incrível, lambão, ficou por ali, só queria mesmo era diária para viajar, até que por fim, o pessoal que ocupava cargos do governo anterior, já tinha raspado as gavetas para ir embora, e, eu nada de me comunicar com eles. Ficaram aporrinhados e mandaram o Samuel Spener ( o Consolo) falar comigo, espevitado, inteligente, cabeludo, cara de sindicalista, mas não era, gostava mesmo era da Festa da Flor do Maracujá.

Samuel veio falar em nome do grupo técnico. Queria uma reunião comigo. Eu disse: e precisa? ele respondeu, – é claro. Nós precisamos ter uma definição. Mandei chamar o pessoal, encheu a mesa, fui logo abrindo o verbo, falei a verdade, que não sabia nada de administração pública, que estava ali para exercer um cargo político, a pedido do governador, que todos poderiam voltar para os seus cargos. E que me ajudassem a não errar. Fazer a coisa certa. Eu precisava deles.

Meus Deus do céu! O pessoal virou um leão. E me ajudaram tanto, porque logo depois veio o SUS, que eu implantei no Estado. Eles pegaram firme, viraram bicho mesmo, e até hoje eu os considero amigos diletos. Conseguimos ajudar o governo pelo tempo que fiquei no cargo.

Confucio Moura


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