Projeto em Manaus visa revitalizar o consumo do ariá, alimento com alto valor nutricional e resiliência climática
O estudante Eli Minev Benzecry, de 17 anos, foi reconhecido como destaque na categoria Jovens Transformadores pelo Clima do Prêmio Empreendedor Social 2025. Ele lidera um projeto que busca reintroduzir e popularizar o ariá, um tubérculo nativo da Amazônia.
A iniciativa, sediada em Manaus (AM), envolveu a criação de hortas urbanas e plantios em nove municípios do Amazonas, além da publicação de um livro de receitas e memórias. O objetivo é valorizar esse alimento tradicional, rico em nutrientes e resistente à seca, que havia desaparecido das feiras locais, oferecendo uma alternativa nutritiva e segura para comunidades frequentemente afetadas pela insegurança alimentar e eventos climáticos extremos.
O retorno do Ariá e a visão de um jovem
O ariá, também conhecido por denominações como dale-dale na Bolívia ou chufle na Guatemala, tem sido consumido por povos originários da América Central e do Sul há pelo menos 9.000 anos. Caracterizado por sua casca bege e miolo esbranquiçado, com textura semelhante à da batata e sabor naturalmente salgado, serviu como sustento para indígenas e ribeirinhos da Amazônia em períodos de escassez hídrica, quando caça e pesca se tornavam impraticáveis. Nas últimas décadas, o tubérculo desapareceu das feiras e mercados de Manaus.
Eli Minev Benzecry, pertencente à quinta geração de uma família com forte conexão à Amazônia, descobriu o ariá por meio de sua avó. Ele conta sobre a relação de sua família com a região: “Minha família tem uma ligação forte com a Amazônia. O pai do meu bisavô, que veio do Marrocos, foi seringueiro. Meu bisavô lecionou economia na Ufam (Universidade Federal do Amazonas) e escreveu diversos livros sobre a região. Mais tarde, fundou a Bemol [empresa de varejo], junto aos irmãos”.
O estudante Eli Minev Benzecry, de 17 anos, foi reconhecido como destaque na categoria Jovens Transformadores pelo Clima do Prêmio Empreendedor Social 2025. Ele lidera um projeto que busca reintroduzir e popularizar o ariá, um tubérculo nativo da Amazônia.
Em 2022, Eli transformou um antigo campo de futebol na zona rural de Manaus em um sistema agroflorestal, onde cultivou diversas espécies como banana e açaí. Ao catalogar os cultivos, sua avó reconheceu o ariá, recordando que o consumia na infância, mas já não o encontrava.
Com o apoio da professora Noemia Ishikawa, do Inpa (Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia), um grupo multidisciplinar foi formado para pesquisar o tubérculo. A investigação revelou um valor nutricional elevado: o ariá possui nove aminoácidos essenciais que o corpo humano não sintetiza. Outra característica é sua resistência à seca, com o período de colheita coincidindo com o início da estiagem, tornando-o uma alternativa em cenários de mudanças climáticas.
A pesquisa também identificou as razões para o declínio do consumo do ariá. Nas áreas urbanas, o tubérculo foi desvalorizado em favor de produtos de outras regiões, como a batata-inglesa. Em comunidades tradicionais, era associado a tempos de pobreza, sendo ingerido quando não havia outras opções de alimentos, como pesca ou caça. A equipe compreendeu que a divulgação científica poderia alterar essa percepção.
Impacto e perspectivas futuras
Para promover a valorização do ariá, o projeto resultou na publicação do livro Ariá: um Alimento de Memória Afetiva, em dezembro de 2024. A obra integra dados científicos, relatos e memórias sobre o tubérculo, além de incluir receitas elaboradas por chefs de renome, como Alex Atala.
Em 2023, o Amazonas enfrentou a mais severa seca de sua história, resultando no isolamento de comunidades e na morte de numerosos animais. Este evento reforçou a importância do ariá como uma solução alimentar resiliente e culturalmente relevante.
O projeto de Eli implementou focos de plantio do tubérculo em nove municípios do Amazonas. Em Manaus, foram estabelecidas hortas nos bairros de Adrianópolis e Parque das Tribos, áreas com concentração indígena urbana. Estima-se que essas iniciativas beneficiem aproximadamente 400 famílias. A disseminação de informações sobre o ariá, por meio do livro e de reportagens, tem estimulado o consumo e a manutenção da planta, e até mesmo a sua comercialização.
Eli Minev Benzecry aspira a integrar o ariá nas merendas escolares do Amazonas no futuro. Ele argumenta que, embora a região possua uma vasta sociodiversidade, crianças ainda consomem alimentos industrializados prejudiciais à saúde. Atualmente, o jovem se prepara para o SAT, o exame de admissão universitária nos Estados Unidos, com planos de cursar economia e bioengenharia.
Ele quer adquirir conhecimento no exterior e aplicá-lo em sua terra natal: “Sou apaixonado pela região e realmente quero viver nela, fazendo a diferença com o conhecimento que adquirir lá fora. A Amazônia tem um potencial imenso. Está na hora de investir nele”, afirma Eli.
(crusoé)